quarta-feira, 22 de março de 2017

Sexo, pecado e religião

Sexo, pecado e religião

Por Padre Beto*

Hoje é incrível como vemos com naturalidade lideres religiosos falando de fé e pregando o Cristo como se estivessem vivendo em uma sociedade justa. O pecado para a religião se tornou algo absurdo e sem reflexão. Outro dia, estava ouvindo um discurso de um professor de teologia da Canção Nova que deixava claro que o pecado que existe no ser humano é a vivência da sexualidade.

Para esse tipo de teologia, a sexualidade é uma mácula, um pecado original, que está no ser humano e contra ao qual devemos a todo custo lutar. Controlar a sexualidade, dizia o professor, é demonstrar amor a Deus. O jovem que não se masturba, dizia o professor, demonstra amor para com Deus. Os namorados que não possuem uma relação sexual demonstram amor para com Deus.

É simplesmente inacreditável que, em pleno século 21, a sexualidade ainda seja vista como algo negativo e a sua vivência uma demonstração de deslealdade para com Deus. Ora, Deus nos criou seres sexuados e o sexo não surgiu no homem pelo pecado, mas representa a natureza divina que temos.

A energia sexual é algo de muito belo e prazeroso. O ser humano que vive de forma saudável sua sexualidade se transforma em um ser centrado e pleno em suas outras dimensões. O sexo em si não é pecado. O pecado é o desamor. A masturbação não é desamor, a relação íntima e consentida entre duas pessoas adultas não é um ato de desamor.
ao invés de lideres religiosos ficarem tão preocupados com a genitália de jovens e adolescentes, eles deveriam estar escandalizados com o sistema público de saúde que mais mata do que salva

Ao invés de lideres religiosos ficarem querendo castrar a sexualidade dos jovens, deveriam alertá-los de que qualquer ato de desamor é um pecado. Não é o sexo que nos afasta de Deus, mas os desejos e atos que destroem a vida e o ser humano. Por isso, ao invés de lideres religiosos ficarem tão preocupados com a genitália de jovens e adolescentes, eles deveriam estar escandalizados com o sistema público de saúde que mais mata do que salva.

As igrejas cristãs deveriam ter questionado, na época, como podemos sediar Copa do Mundo, Olimpíadas e Paralimpíadas se não temos uma política de base para os esportes, se os poucos atletas que temos precisam treinar fora do país, se a acessibilidade básica ainda está longe de ser uma realidade em nossas cidades. Isso é o mesmo que querer ter a cereja do bolo sem ter o bolo.

Os líderes religiosos deveriam estar saindo às ruas com suas comunidades exigindo o aumento de salário dos professores da rede pública de ensino, exigindo o aumento de salário dos policiais e o aumento da aposentadoria dos filhos de Deus que precisam continuar trabalhando na terceira idade.

As religiões que se dizem cristãs deveriam estar discutindo o sistema penitenciário e o narcotráfico se realmente pregam a mensagem de Jesus Cristo. Que tipo de pregação sobre o amor de Deus é essa que valoriza regras morais da época vitoriana e fecha os olhos para problemas tão sérios que atingem o ser humano.

Cada fiel que pertence a uma igreja deveria se perguntar: Meu bispo já fez uma visita oficial ao pronto atendimento da minha cidade? O meu padre já visitou oficialmente a câmara municipal para exigir alguma melhoria para o bairro? Meu pastor já se envolveu concretamente para que o Estado venha a cumprir com os direitos fundamentais dos cidadãos, sejam eles seus fieis ou não? Se a resposta for negativa, o fiel pode ter certeza que está fazendo parte de um clube social e não de uma verdadeira religião.

*Padre Beto, escritor, cronista, filósofo é formado em direito pela Instituição Toledo de Ensino (ITE), em história pela Universidade do Sagrado Coração (USC) e em teologia pela Ludwig-Maximillian, de Munique (Alemanha)

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