quinta-feira, 10 de maio de 2018

Não é possível uma política neoliberal num país como o Brasil, por Rogerio Maestri


Não é possível uma política neoliberal num país como o Brasil

por Rogerio Maestri

A impossibilidade da imposição de um capitalismo financeiro global em países periféricos.

Explicando melhor, o capitalismo financeiro, diferentemente do capitalismo do século passado, o capitalismo fordista, tira inúmeros “benefícios sociais” que não são nada mais e nada menos da criação de condições mínimas para o treinamento de seus explorados para que estes participem da produção.

O esquema que o capitalismo financeiro pretende introduzir em todo o mundo passa por transformar em produto o que era pago através de impostos e considerado como benefícios sociais, ou seja, tenta-se mercantilizar o ensino, a saúde e demais benefícios que eram ou ainda são pagos parcialmente por impostos transformando-os em mera mercadoria a ser comercializada a quem tem dinheiro para pagar. Anedoticamente podemos dizer que esta tentativa de mercantilização total da economia chega até atingir a religião mercantilizando a mediação entre a figura divina e o homem com as religiões pentecostais adeptas da chamada teologia da prosperidade. A religião no passado era com cobrança indireta, mas como é necessário maximizar ainda mais os lucros se passou a chantagear os fiéis dizendo que quem não paga ao pastor não atingirá os céus.

No esquema fordista que se desenvolveu no século XX, as fábricas do passado haviam os operários que depois de um ter um ensino básico precário, mas público, era acolhido pela empresa e nela era treinado continuamente para poderem movimentar a máquina de produção. O treinamento ainda é possível de ser fornecido, porém é feito atualmente através de esquemas de diminuição de custo, estagiários ou trainees, que deixam de ser funcionários para serem cargos precários em que o emprego na realidade é uma promessa se o desempenho seguir o que desejam os patrões sem nenhum padrão definido a priori.

Ou seja, para que o indivíduo chegue ao nível de produtividade que é estabelecido pelo patrão, mas desconhecido para o estagiário ou trainee, antes passa por um é necessário um período de estudo básico, as escolas tradicionais ou mesmo as profissionalizantes, em que o mesmo era parcialmente bancado pelo estado social, mas que será já transformado em negócio que deverá ser bancado pelos pais ou por uma dupla jornada de trabalho do aluno. Desta forma desde o seu nascimento até sua idade capaz de começar entrar na produção, parte da mais valia produzida pelas gerações anteriores que eram canalizadas via impostos para cobrir os custos de seu treinamento, terão que ser bancadas pelas estruturas familiares.

Esta redistribuição da mais valia obtida pela superexploração do trabalho era redistribuída via impostos que cobriam desde o nascimento, o ensino básico e um ensino médio ou mesmo o ensino superior, será considerado um custo a ser assumido por aqueles que pretendem entrar na produção.

Com o aumento da sofisticação da produção os custos se tornam crescentes, pois o tempo e a qualidade do ensino levavam a produção mais tardia tanto para os operários, ou quadros médios e superiores. Este aumento do tempo de treinamento implica que o custo não só para ensino, mas como também o custo com saúde e habitação aumentam.

Ao mesmo tempo que o custo de treinamento foram aumentando com o tempo, a globalização da economia impôs uma diminuição dos salários a nível planetário, pois coloca em competição num mesmo mercado de trabalho tanto pessoas advindas de sociedades mais evoluídas em termos econômicos como sociedades emergentes ou meramente periféricas e miseráveis, estas últimas dispostas a qualquer sacrifício para atingir um emprego ou posição de falso autônomo parceiro.

Outro problema que ocorre é que mesmo com o sacrifício individual, a automação faz com que parte deste incremento de custo por períodos de treinamento mais longos e mais qualificados, são diminuídos pela automatização e robotização diminuindo o custo da mão de obra.

Nos países centrais embora haja uma diminuição clara dos salários e a mão de obra é mais qualificada, as famílias têm capacidade de manter por maior período a formação dos seus trabalhadores do futuro, devido a pequena acumulação obtida nas gerações passadas, podendo em parte pagar o que no passado recente era fornecido pelo Estado via impostos.

Nos mesmos países centrais, aqueles que não conseguem se incorporar no mercado por múltiplos problemas individuais, são parcialmente acolhidos com resíduos da estado de bem estar do passado, tipo seguro desemprego ou benefícios sociais mínimos, que garantem que mesmo com um desemprego estrutural de alta taxa, ainda as pessoas não atinjam condições de miséria absoluta.

Nos países periféricos, seguindo a mesma lógica do mercado global, primeiro as famílias, que em grande parte são desestruturadas, não tem condição a manter seus descendentes e muito menos contribuir com a sua educação e demais necessidades. Esta transposição de padrões de exploração do trabalho no primeiro mundo, não tem a mínima viabilidade de se reproduzir nos países periféricos, pois as famílias além de não conseguirem manter por conta própria os encargos que eram públicos e se tornarão mercadorias, não há um capital cultural para ser transmitido aos mais jovens que necessitarão de um treinamento mais sofisticado que exige o mercado.

A grande conclusão que se pode chegar, que há somente dois caminhos aos países periféricos, ou recompõe padrões de Estado, com um custo ainda mais elevado que nos países centrais, ou criarão um imenso contingente de pessoas fora da produção que nem poderão ser chamados de “exército de reserva”, pois não dispõe do treinamento necessário para ingressar na produção.

Quer dizer, os pais operários não terão capacidade financeira de custear a educação básica e a saúde se esta não for paga pelo Estado, da mesma forma a pequena burguesia não terá também capacidade de fornecer uma educação superior, que nos dias atuais não pode ficar restrita a um curso de graduação numa escola privada de segunda linha, mas no futuro necessitará de cursos superiores de melhor nível e maior custo, assim como cursos e treinamento complementares (cursos de línguas, mestrado, MBA.....),

Além disto, a privatização da saúde é outro fator extremamente importante, a medida que a complexidade dos procedimentos médicos sobe de custo e só nos dias atuais milhões de famílias que possuíam previdência complementar está deixando de pagar os planos.

Níveis de desemprego com altas taxas maiores do que 25%, são temporariamente absorvidos por países centrais, através de programas de renda mínima ou benefícios diversos como cupões de alimentação e subsídio a moradia além de ensino gratuito nos níveis iniciais. Também é possível manter parte deste, no caso “exército de reserva”, pagos por empregos de tempo parcial que os deixam prontos para em um momento ou outro, que situações especiais exijam, incorporá-los a produção com salários mais baixos.

Muitos perguntam o porque é que há pouco tempo, durante a forte recessão que atingiu o primeiro mundo, esta mesma recessão não chegou com tal firmeza nos países periféricos, simplesmente porque a chegada deste tipo de política liberal com achatamento de salários e aumento do desemprego leva necessariamente ao caos social, e mesmo com forças de repressão fortes não há como conter este caos.

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